Decisão TJSC

Processo: 5030088-47.2025.8.24.0023

Recurso: recurso

Relator: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA

Órgão julgador:

Data do julgamento: 13 de novembro de 2025

Ementa

RECURSO – DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. EXTRAVIO DE BAGAGEM . SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE RÉ. DESPROVIMENTO. I . CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação interposta por companhia aérea contra sentença que julgou procedentes os pedidos autorais, arbitrando indenização por danos materiais e morais em decorrência do extravio temporário de bagagens em viagem internacional. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2 . A questão em discussão consiste em determinar se: (i) deve ser mantido o dever de indenizar, considerando a aplicação das Convenções de Varsóvia e Montreal em detrimento do Código de Defesa do Consumidor; (ii) houve dano moral passível de indenização e se a respectiva indenização foi arbitrada em valor adequado; (iii) os valores despendidos pelos autores são considerados itens de luxo e se a bagagem foi devolvida dentro do prazo legal. III. RA...

(TJSC; Processo nº 5030088-47.2025.8.24.0023; Recurso: recurso; Relator: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)

Texto completo da decisão

Documento:6708442 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5030088-47.2025.8.24.0023/SC RELATORA: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta por B. B. A. contra sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca da Capital, o qual julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da Ação Indenizatória. Para propósitos de economia, e como representa adequadamente o trâmite processual, adoto o relatório realizado pelo Magistrado de origem (evento 30, SENT1). B. B. A. ajuizou a presente ação indenizatória contra TAM LINHAS AEREAS S/A., sustentando, em suma, que adquiriu passagens áreas de ida e volta de Florianópolis até Nova York, entretanto, teve sua bagagem extraviada por mais de 6 (seis) dias, recebendo somente após seu retorno. Culminou por requerer a condenação da requerida na indenização no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de dano moral. Formulou os demais pedidos de praxe, juntou procuração e documentos. Citada, a empresa área apresentou contestação (14.1), arguindo que a devolução da bagagem extraviada observou a resolução n. 400 da ANAC. Por fim, requereu a improcedência dos pedidos iniciais. Houve réplica (21.1). Intimadas se pretendem a produção de outras provas, a parte autora renunciou ao prazo, enquanto a parte ré requereu o julgamento antecipado da lide. Os autos vieram-me conclusos. É o relatório. No dispositivo da sentença constou: Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais formulados por B. B. A. contra TAM LINHAS AEREAS S/A. para CONDENAR a demandada ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a título de danos morais, a ser corrigido monetariamente desde o arbitramento e acrescido de juros de mora a contar da citação, observados os termos dos art. 389, caput e parágrafo único, 395, 404 e 406, do Código Civil, com a redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024. Sucumbente a parte ré, condeno-a ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, com apoio no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Passado em julgado, arquivem-se. Em suas razões recursais sustenta, em síntese, que o valor fixado a título de danos morais (R$ 4.000,00) é insuficiente para fins de reparação, pugnando pela majoração para o montante de R$ 15.000,00, conforme requerido na inicial (evento 35, APELAÇÃO1). Em contrarrazões a apelada pleiteia a manutenção da sentença recorrida (evento 45, CONTRAZAP1). É o relatório. VOTO De início, cabe a análise da admissibilidade. Verifico que a apelação é tempestiva, o preparo foi recolhido (evento 39, CUSTAS1), a parte está regularmente representada, o recurso e as razões desafiam a decisão objurgada, ao passo que não incidem nas hipóteses do art. 932, IV, do CPC. Presentes, portanto, os requisitos intrínsecos e extrínsecos, conheço do recurso. De antemão, cumpre consignar que restou devidamente comprovado nos autos o nexo de causalidade entre a conduta omissiva da apelada, ora ré, e os prejuízos experimentados pelo autor.  Logo, incontroversa a falha na prestação do serviço da companhia aérea ré é, consequentemente, o dever de indenizar. Superada essa questão, passa-se à análise, nesta instância revisora, da adequação dos parâmetros utilizados pelo juízo o quo para a fixação do quantum indenizatório a título de danos morais. Como cediço, a legislação pátria não estabelece critérios objetivos e rígidos para tal fixação, cabendo aos magistrados, no exercício de seu prudente arbítrio, valorar o caso concreto à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando as provas constantes nos autos. No caso, o apelante é portador de condição metabólica rara e grave (Glicogenose tipo 1a), necessitando de rigoroso controle diário da glicemia, com administração contínua de Glycosade, além de dieta regrada, posto que a interrupção do tratamento gera risco de vida, conforme laudo confeccionado pela médica que faz o acompanhamento do autor (evento 1, ATESTMED3). Dessarte, a peculiaridade do caso em exame, por sua natureza, não pode ser considerada irrelevante, principalmente diante do fato de que o extravio da bagagem impossibilitou o apelante, ora autor, de ter acesso aos materiais e suplementos necessários à manutenção da sua doença, como balança para calcular porções alimentares, o amido purificado (Glycosade) e instrumentos utilizados no controle da glicemia. Ademais, em razão de sua doença, teve que interromper sua programação para adquirir os suplementos necessários à manutenção de sua saúde. Conforme afirmado pelo autor em sede recursal (evento 35, APELAÇÃO1), além de se ver privado dos suplementos necessários ao controle de sua doença, teve que consumir produtos industrializados padronizados. Enfatizou, também, que não conseguiu substituir de forma adequada sua balança digital, necessária à dosagem dos alimentos, circunstâncias estas que acarretaram oscilações glicêmicas, as quais lhe causaram mal-estar e problemas para conciliar o sono.  Ressalta-se, ainda, que embora a restituição dos pertences tenha sido realizada dentro do prazo prescrito (Resolução n. 400/2016 da ANAC), conforme afirmado pela ré, a mesma somente ocorreu após seu retorno ao Brasil, ou seja, durante seis dias se viu privado de seus pertences, ora primordiais à sua saúde, posto que é portador de moléstia grave. Não bastasse isso, além de ser ver desprovido de seus aparelhos e suplementos, o apelante ficou todo o período programado sem suas vestimentas, tendo que adquirir algumas peças ou até mesmo reutilizá-las, situação esta, que, por si só, já configura abalo anímico. Cumpre destacar que a alegação da ré, constante da contestação, no sentido de que o autor não teria observado as recomendações relativas ao transporte de medicamentos em bagagem despachada (evento 45, CONTRAZAP1), revela-se irrelevante para a solução da controvérsia, por não possuir respaldo normativo, tratando-se de mera orientação, sem imposição obrigatória ao consumidor. Nessa vertente, torna-se evidente que o valor fixado pelo juízo o quo (R$ 4.000,00) é irrisório diante do transtorno e sofrimento psicológico vivenciado pelo autor. Certo é que a situação enfrentada pelo recorrente transcende o mero dissabor cotidiano, alcançando patamar de gravidade que, em virtude das implicações à sua saúde, impõe a majoração da reparação, a fim de atender aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como ao caráter pedagógico e compensatório da indenização por danos morais. Partindo dessa premissa, entendo que a indenização deve ser majorada para o importe de R$ 7.000,00 (sete mil reais), valor este adequadamente quantificado levando-se em conta as peculiaridades do caso, não havendo que se falar em enriquecimento ilícito da parte autora, e suficiente para cumprir a função de reprimenda em relação à parte ré, servindo de desestímulo à reiteração do ato ilícito. Sobre o assunto, colhe-se entendimento desta Corte: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS POR EXTRAVIO DE BAGAGEM. TRANSPORTE AÉREO. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM . PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. ITINERÁRIO FLORIANÓPOLIS-LISBOA. TRANSPORTADORA QUE DEVE CONDUZIR COM SEGURANÇA E CAUTELA TANTO O PASSAGEIRO COMO SUAS BAGAGENS. ENTREGA QUE DEVE OCORRER NO DESEMBARQUE . ATO ILÍCITO CARACTERIZADO. DANOS MORAIS. BAGAGEM QUE FOI ENTREGUE SOMENTE APÓS OS AUTORES RETORNAREM AO BRASIL. REQUERENTES QUE FICARAM 22 DIAS SEM PODER USUFRUIR DE SEUS PERTENCES . FRUSTRAÇÕES E ANGÚSTIAS QUE TRANSCENDEM O MERO DISSABOR. INDENIZAÇÃO QUE DEVE SER MAJORADA DE R$ 7.000,00 PARA R$ 10.000,00 . RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTE DESTE TRIBUNAL. SENTENÇA MODIFICADA NO TÓPICO. DANOS MATERIAIS . APLICAÇÃO DOS LIMITES INDENIZATÓRIOS PREVISTOS NA CONVENÇÃO DE MONTREAL. TEMA 210 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DECLARAÇÃO ESPECIAL INEXISTENTE. INDENIZAÇÃO QUE DEVE SER LIMITADA A 1 .000 DIREITOS ESPECIAIS DE SAQUE. HONORÁRIOS RECURSAIS CABÍVEIS EM DESFAVOR DA RÉ. RECURSO DA EMPRESA REQUERIDA CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DOS AUTORES CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO .(TJSC - AC n. 50138194420228240020, Rel. Des. Flavio Andre Paz de Brum, j. em 30.3.2023, Primeira Câmara de Direito Civil). Em caso semelhante: EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. EXTRAVIO DE BAGAGEM . SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE RÉ. DESPROVIMENTO. I . CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação interposta por companhia aérea contra sentença que julgou procedentes os pedidos autorais, arbitrando indenização por danos materiais e morais em decorrência do extravio temporário de bagagens em viagem internacional. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2 . A questão em discussão consiste em determinar se: (i) deve ser mantido o dever de indenizar, considerando a aplicação das Convenções de Varsóvia e Montreal em detrimento do Código de Defesa do Consumidor; (ii) houve dano moral passível de indenização e se a respectiva indenização foi arbitrada em valor adequado; (iii) os valores despendidos pelos autores são considerados itens de luxo e se a bagagem foi devolvida dentro do prazo legal. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Constituição Federal, em seu art . 178, estabelece a prevalência das Convenções Internacionais sobre o Código de Defesa do Consumidor para danos materiais. O Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5030088-47.2025.8.24.0023/SC RELATORA: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA EMENTA DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. majoração do quantum indenizatório. Recurso conhecido e provido em parte.  1. Trata-se de ação indenizatória ajuizada em razão do extravio temporário de bagagem durante viagem internacional, que continha itens essenciais à manutenção da saúde da parte autora, portadora de doença metabólica rara. A sentença de origem julgou procedente o pedido, fixando indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00. Recurso interposto visando à majoração do quantum indenizatório. 2. A questão em discussão consiste em saber se o valor fixado a título de danos morais é adequado diante das peculiaridades do caso. 3. A responsabilidade civil da empresa aérea decorre da falha na prestação do serviço, evidenciada pelo extravio da bagagem, ainda que temporário. 3.1. A privação dos pertences essenciais à saúde da parte apelante, especialmente em razão de moléstia grave, ultrapassa o mero dissabor cotidiano, justificando a majoração da indenização, no valor de R$ 7.000,00. 3.2. O valor inicialmente fixado revela-se insuficiente para atender aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e à função pedagógica da reparação. 4. Recurso conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. O extravio temporário de bagagem configura falha na prestação do serviço e enseja o dever de indenizar. 2. A indenização por danos morais deve ser adequada às peculiaridades do caso, observando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Jurisprudência Relevante Citada: TJSC - AC 50138194420228240020, Rel. Des. Flavio Andre Paz de Brum, j. em 30.3.2023, Primeira Câmara de Direito Civil; TJSC, Apelação n. 5032252-98.2023.8.24.0008, Rel. Mauro Ferrandin, Sexta Câmara de Direito Civil, j. em 18.2.2025. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para majorar o quantum indenizatório no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), incidindo juros e correção monetária nos moldes fixados na sentença.1, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 13 de novembro de 2025. assinado por ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6708443v58 e do código CRC 872d6ee7. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA Data e Hora: 13/11/2025, às 19:09:15     5030088-47.2025.8.24.0023 6708443 .V58 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:34:29. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 13/11/2025 Apelação Nº 5030088-47.2025.8.24.0023/SC RELATORA: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA PRESIDENTE: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO PROCURADOR(A): PAULO CEZAR RAMOS DE OLIVEIRA SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: MATHEUS DOS SANTOS AMARAL por TAM LINHAS AEREAS S/A. Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 13/11/2025, na sequência 38, disponibilizada no DJe de 27/10/2025. Certifico que a 4ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 4ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, PARA MAJORAR O QUANTUM INDENIZATÓRIO NO VALOR DE R$ 7.000,00 (SETE MIL REAIS), INCIDINDO JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NOS MOLDES FIXADOS NA SENTENÇA.1. RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA Votante: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA Votante: Desembargador VITORALDO BRIDI Votante: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:34:29. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas